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A expansão do papel das Guardas Municipais: Implicações da decisão do STF

Você já se perguntou qual é o verdadeiro papel das guardas municipais na segurança pública brasileira?

Tradicionalmente, essas corporações eram vistas como responsáveis apenas pela proteção de bens, serviços e instalações municipais. No entanto, essa realidade está mudando. Com uma decisão histórica do Supremo Tribunal Federal (STF), foi reconhecida a possibilidade de as guardas municipais exercerem policiamento ostensivo e comunitário. Mas o que isso significa na prática? Como essa mudança impacta a segurança pública e a vida dos cidadãos?

Nos últimos anos, a crescente demanda por mais segurança nas cidades impulsionou a ampliação das atribuições dessas corporações. Agora, com o respaldo do STF, as guardas municipais passam a ocupar um espaço ainda mais relevante dentro do sistema de segurança pública brasileiro. Este artigo examina a decisão da Suprema Corte, seus impactos na estrutura das guardas municipais e os desafios que essa transformação traz.

O Contexto Jurídico e a Decisão do STF

A Constituição Federal de 1988 estabelece no artigo 144, §8º, a possibilidade de criação de guardas municipais para a proteção do patrimônio municipal. No entanto, a interpretação desse dispositivo sempre gerou controvérsias, especialmente quanto à possibilidade de atuação dessas corporações no policiamento preventivo. A decisão do STF no Recurso Extraordinário 608.588, com repercussão geral, fixou a tese de que é constitucional a atuação das guardas municipais em ações de policiamento ostensivo e comunitário, desde que respeitadas as competências das demais forças de segurança pública. Segundo o relator do caso, ministro Luiz Fux, a norma municipal que atribui tais funções às guardas está em conformidade com a Constituição e com o Estatuto Geral das Guardas Municipais (Lei 13.022/14).

A decisão foi celebrada por diversos especialistas em segurança pública, que argumentam que a proximidade das guardas municipais com a população facilita a execução de ações preventivas e de policiamento comunitário. No entanto, houve divergências no julgamento, com ministros como Cristiano Zanin e Edson Fachin adotando uma visão mais restritiva, argumentando que a atuação das guardas deve ser limitada à proteção de bens e serviços municipais.

Impactos na Segurança Pública e na Estrutura das Guardas Municipais

Com a decisão do STF, abre-se um novo horizonte para a atuação das guardas municipais no Brasil. O reconhecimento de sua competência para o policiamento ostensivo pode impactar diretamente a forma como a segurança urbana é gerida nos municípios. Um dos efeitos imediatos da decisão é a possibilidade de ampliação dos efetivos das guardas municipais e a necessidade de investimentos em capacitação e treinamento desses agentes. Afinal, o exercício da atividade policial demanda preparo técnico, conhecimentos jurídicos e táticas operacionais compatíveis com a realidade da segurança pública brasileira.

Outro aspecto relevante é a relação entre as guardas municipais e as polícias estaduais. Enquanto as polícias militares são responsáveis pelo policiamento ostensivo tradicional e as polícias civis pela investigação de crimes, as guardas municipais passam a desempenhar um papel intermediário, focado na prevenção e na manutenção da ordem pública em nível local. Essa nova configuração exige um modelo de cooperação e integração entre as forças de segurança, evitando sobreposição de funções e conflitos institucionais.

A decisão do STF também reforça a tendência de municipalização da segurança pública, descentralizando algumas atribuições que antes eram exclusivas das esferas estadual e federal. Municípios como São Paulo e Rio de Janeiro já começaram a se movimentar nesse sentido, com o prefeito da capital paulista anunciando a reestruturação da Guarda Civil Metropolitana para transformá-la em Polícia Metropolitana, enquanto no Rio de Janeiro há um projeto para criar a Força Municipal de Segurança.

Desafios e Perspectivas

Apesar dos avanços proporcionados pela decisão do STF, há desafios que precisam ser enfrentados para que essa expansão das guardas municipais seja bem-sucedida. Um dos principais desafios é a necessidade de regulamentação clara para definir os limites e responsabilidades dessas corporações. A Lei 13.022/14 já estabelece diretrizes gerais, mas a falta de uniformidade entre os municípios pode gerar distorções na aplicação das normas.

Outro ponto crítico é o financiamento. Diferente das polícias estaduais, que contam com recursos dos governos estaduais e federais, as guardas municipais dependem do orçamento municipal, que muitas vezes é insuficiente para a ampliação de efetivo e aquisição de equipamentos. Dessa forma, o sucesso dessa nova fase da segurança pública municipal dependerá da capacidade dos gestores locais em garantir investimentos adequados para a estruturação dessas forças.

Além disso, é necessário considerar os impactos sociais dessa decisão. A aceitação da população em relação às guardas municipais varia conforme a região e a experiência prévia com essas corporações. Enquanto algumas cidades já possuem guardas municipais bem estruturadas e integradas à comunidade, em outros municípios essas instituições ainda carecem de legitimidade e reconhecimento.

Conclusão

A decisão do STF de reconhecer a constitucionalidade do policiamento ostensivo pelas guardas municipais representa um marco para a segurança pública no Brasil. Esse novo paradigma reforça o papel dessas corporações na proteção da sociedade e amplia sua atuação para além da simples vigilância patrimonial. No entanto, a implementação dessa nova realidade exigirá investimentos, regulamentação e uma gestão eficiente para garantir que a ampliação de suas competências seja feita de forma eficaz e alinhada com os princípios da segurança pública democrática.

Dessa forma, as guardas municipais podem se tornar um pilar fundamental na estratégia de segurança urbana, desde que recebam os recursos e a capacitação necessários para desempenhar essa nova função. O caminho para a transformação dessas instituições em forças policiais municipais está aberto, mas será preciso superar desafios operacionais e estruturais para que essa mudança ocorra de maneira sustentável e eficiente.

Fonte: REDE TV NEWS

 

Prof. Dr. Valdemir Oliveira da Silveira

Professor Titular de Direito da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), sócio da Advocacia Ubirajara Silveira (AUS).
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